A reprovação ao desempenho de Jair Bolsonaro na crise do novo coronavírus é elevada mesmo entre os brasileiros que recebem o auxílio emergencial. De acordo com pesquisa Datafolha, a atuação de Bolsonaro é rejeitada por quase metade dos entrevistados, independentemente de terem recebido o benefício ou nem terem solicitado o pagamento.
De acordo com os dados do Datafolha, entre os que pediram e já receberam pelo menos uma parcela do auxílio financeiro, 49% consideram o trabalho do presidente na crise da Covid-19 ruim ou péssimo. Para a população que não fez o pedido do benefício, a atuação é considerada ruim ou péssima por 51%.
No grupo que recebeu o auxílio, apenas 26% avaliam o desempenho como ótimo ou bom, e 24%, como regular. Cenário similar foi verificado entre os que nem sequer pediram o benefício: 27% classificaram como ótimo ou bom, e 22%, como regular.
Até o balanço mais recente divulgado pela Caixa, na sexta-feira (26), 64,1 milhões de brasileiros já haviam recebido a renda emergencial. A pesquisa indica que a população, de modo geral, reconhece esse auxílio como uma conquista da oposição a Bolsonaro – e não do próprio governo.
Não é por acaso. Sob a influência do ministro ultraliberal da Economia, Paulo Guedes, a gestão bolsonarista tentou sabotar a iniciativa desde a primeira hora. O auxílio – que começou a ser pago em abril – foi criado para atenuar a perda de renda de trabalhadores informais, MEIs (microempreendedores individuais), autônomos e desempregados afetados pelas medidas restritivas adotadas no combate à pandemia do coronavírus.
Inicialmente, o governo propôs um valor irrisório de R$ 200 por parcela (três, no total). Diante de articulação dos movimentos sociais e da oposição no Congresso para elevar o pagamento, Bolsonaro foi obrigado a aceitar uma ajuda de R$ 600 mensais, podendo chegar a R$ 1.200 para mãe chefe de família. O benefício foi definido em três parcelas.
O programa, de resto, estimulou o debate para ampliação das ações de transferência de renda no país, reformulando o Bolsa Família e atendendo também a trabalhadores informais. Com o avanço da pandemia no Brasil, o governo anunciou nesta terça-feira (30) a prorrogação do auxílio emergencial por mais dois meses, mantendo o valor de R$ 600 mensais.
Mesmo assim, em meio à discussão sobre a prorrogação do auxílio, a equipe econômica chegou a defender mais duas parcelas do benefício, no valor de R$ 300 cada uma. O próprio Bolsonaro chegou a dizer que vetaria qualquer proposta para aumentar o repasse. Sob nova pressão, porém, o governo voltou a ceder.
O Datafolha ouviu 2.016 pessoas por telefone na terça (23) e na quarta (24), às vésperas do início do pagamento da terceira parcela do benefício. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
A maioria do grupo que já recebeu pelo menos uma parcela do auxílio (61%) considera que Bolsonaro mais atrapalha do que ajuda no combate ao coronavírus. Essa também foi a avaliação de 61% dos entrevistados que não pediram a ajuda financeira.
Há novamente uma grande proximidade na proporção daqueles que acham que o presidente mais ajuda do que atrapalha na luta contra a Covid-19. Essa foi a opinião de 33% entre os que receberam o benefício emergencial e de 34% entre os que não pediram o pagamento.
A cobertura do auxílio emergencial atende majoritariamente à população mais pobre. De acordo com a pesquisa do Datafolha, 80% dos que dizem ter recebido ao menos uma parcela têm renda familiar de até dois salários mínimos (R$ 2.090). O benefício é pago principalmente à fatia da população mais vulnerável e com renda mais instável.
Um exemplo: 24% não têm trabalho fixo (fazem bico e serviços esporádicos); 17% são desempregados; 17% são donas de casa; e 15% são autônomos. Em relação à distribuição do benefício no território nacional, o programa segue a linha da divisão da população no país. A maioria (61%) que teve acesso ao auxílio mora no interior. Além disso, 40% dos que receberam o recurso moram na região Sudeste, e 33%, no Nordeste.
Letalidade
Outra evidência do desgaste do governo é que o discurso negacionista do presidente na epidemia pode ter contribuído para matar principalmente seus eleitores. Em praticamente todas as ocasiões em que ele minimizou a pandemia, a taxa de isolamento social no Brasil diminuiu – e mais pessoas morreram, proporcionalmente, nos municípios que mais votaram em Bolsonaro em 2018.
A conclusão é do estudo “Ideologia, isolamento e morte: uma análise dos efeitos do bolsonarismo na pandemia de Covid-19”, de quatro pesquisadores da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo. Conforme o trabalho, a votação do presidente no primeiro turno, por município, tem correlação negativa com a taxa de isolamento; e correlação positiva com mortes por Covid-19.