Os gestores de estados e municípios que, durante a pandemia do coronavírus, afrouxarem medidas de distanciamento social deverão assegurar a oferta de um sistema de saúde preparado para a demanda. O alerta é da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal, que defende a responsabilização por improbidade administrativa dos gestores locais que descumprirem tais orientações.
Segundo a PFDC, a redução dos esforços de supressão de contato social pode levar a um eventual aumento de número de casos de Covid-19. Por isso, a medida deve, em contrapartida, garantir que a rede pública tenha disponibilidade suficiente de respiradores, equipamentos de proteção individual, testes laboratoriais, além de leitos de UTI e internação, capazes de absorver uma explosão de novos casos da doença.
Uma eventual decisão de mitigação da estratégia de distanciamento social deve, ainda, ser pública e estar fundamentada nas orientações explicitadas no Boletim Epidemiológico nº 8, do Ministério da Saúde, com demonstração de superação da fase de aceleração do contágio, de acordo com os dados de contaminação, internação e óbito.
A PFDC reforça um alerta do Ministério da Saúde: qualquer flexibilização da medida está condicionada à garantia de que o sistema de saúde pública esteja estruturado para atender ao pico da demanda. Em seu Boletim Epidemiológico nº 8, além de respiradores e EPIs, a pasta cobra a garantia de recursos humanos para o manejo de cuidados básicos e avançados de pacientes da covid-19, leitos de UTI e de internação, bem como testes laboratoriais para o diagnóstico dos pacientes.
Para a PFDC, qualquer mudança na estratégia de quarentena deve ser adotada só se houver um sistema de saúde à altura. “A decisão de manter, ou não, aberto o comércio e a atividade econômica em geral pode significar uma diferença de mais de 1 milhão de vidas”, diz a Procuradoria. “A simples mitigação do esforço de quarentena social pode produzir catastróficos impactos em relação à estratégia de supressão do contato social, tal como mais 90 milhões de brasileiros infectados em até 250 dias, 280 mil cidadãos mortos e 2 milhões de internações.”
O órgão do Ministério Público Federal chama atenção para o fato de que a aparente inexistência de casos em larga escala em algumas localidades não deve servir de parâmetro para qualquer decisão. Como os contágios ocorrem em escala exponencial, uma percepção aritmética certamente induz a erro de avaliação. Além disso, devido à limitada disponibilidade de testes para diagnóstico, há subnotificação de casos.
Dever constitucional
Na nota pública, a Procuradoria diz que é dever do Poder Público garantir o direito fundamental à saúde da população. Conforme o artigo 196 da Constituição, as políticas públicas devem visar à redução do risco. “Mesmo que estejam em jogo duas alternativas igualmente possíveis em termos de saúde, a escolha necessariamente deve recair sobre aquela que representa o menor risco para a coletividade”, reforça o texto. Assim, se o governante não seguir esse princípio, ficará caracterizada a improbidade administrativa.
Em seu posicionamento, a PFDC reconhece que a paralisação da atividade econômica e da vida social traz graves prejuízos para o gozo de diversos direitos fundamentais. Mas, diante da pandemia e da incapacidade de Estados nacionais de assegurar luto digno a familiares e amigos, é inevitável a prioridade ao direito à vida e à saúde da população. “O Estado e a sociedade brasileiros têm o dever (…) de esgotar os mecanismos de garantia de renda e serviços essenciais à coletividade, bem como repartição tributária adequada e equitativa dos encargos decorrentes desse esforço extraordinário”.
Via do MPF