Por que a CPI da Covid-19 vai pressionar e expor Bolsonaro ainda mais
Coronavírus 12/04/2021 Escrito por: DW
Está chegando a hora de o governo Bolsonaro ser investigado numa CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Na próxima semana, pela primeira vez em mais de dois anos de mandato, o presidente vai passar a enfrentar uma investigação no Congresso que tem como objeto seu governo. O tema: a criminosa gestão do Planalto durante a pandemia de Covid-19.
A CPI chega em momento já difícil para o governo, pressionando e expondo Bolsonaro ainda mais. O presidente enfrenta hoje um cenário econômico caótico, uma interminável crise sanitária, índices de popularidade em queda e uma relação tumultuada com sua recém-expandida base de apoio no Congresso. Pesquisa Datafolha de março mostrou que 54% dos brasileiros reprovam desempenho de Bolsonaro na pandemia.
O País também passa pelo pior momento da pandemia, registrando regularmente marcas de mais de 3 mil e até 4 mil mortes por dia, com diversas cidades enfrentando o colapso das suas redes hospitalares. Não à toa, o presidente reagiu com virulência à instalação da CPI, distribuindo ataques ao STF.
Segundo o pedido apresentado no Senado, o objetivo da CPI é “apurar as ações e omissões do governo federal no enfrentamento da pandemia da covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados”. Em pouco mais de um ano de pandemia, o governo se notabilizou por minimizar o perigo, sabotar medidas de distanciamento social, promover curas ineficazes e evitar articular uma política de enfrentamento nacional.
Além disso, Bolsonaro promoveu teses infundadas sobre supostos riscos de vacinas e demonstrou desinteresse em garantir imunizantes para a população. No caso de Manaus, o Ministério da Saúde decidiu não agir para impedir o colapso do sistema de saúde da cidade em janeiro, mesmo sabendo dos problemas de antemão. Resultado: o Brasil ultrapassou a marca de 350 mil mortes por Covid-19 apenas 17 dias após cruzar a linha de 300 mil.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse neste sábado (10) que vai realizar na próxima terça-feira a leitura em plenário do requerimento de criação da CPI da Pandemia, marcando oficialmente a instalação do colegiado. A leitura do ato deve mostrar que o Senado está cumprindo a determinação do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, que na última quinta-feira mandou Pacheco criar a CPA.
Pacheco resistia a instalar a comissão, mesmo com a oposição reunindo o número de assinaturas necessárias para a instalação da comissão. Até o momento, o requerimento reúne 32 nomes, mais do que os 27 necessários. O plenário do STF deve julgar na próxima quarta-feira a decisão de Barroso – a tendência é que a decisão seja mantida.
No Senado, embora Pacheco ainda demonstre alinhamento com Bolsonaro, a base do governo na Casa é mais frágil. Ao contrário da Câmara, não há um “Centrão” amplo no Senado que concentre demandas de parlamentares por cargos e verbas. Ademais, não há nenhum ministro senador, ao contrário do que ocorre com deputados. A instalação da CPI deve aumentar o poder de barganha de senadores nas articulações com o Planalto.
No momento, o Planalto trabalha para tentar convencer alguns senadores a retirarem suas assinaturas do requerimento para a criação da CPI para garantir que não haja o mínimo necessário. Segundo o regimento do Senado, parlamentares podem retirar assinaturas até a meia-noite do dia em que o requerimento de instalação da CPI for lido em plenário – o que está previsto para a próxima terça-feira.
Caso a manobra não seja bem-sucedida, a base governista quer atrasar o início dos trabalhos da comissão, tentando convencer algumas bancadas a não indicarem representantes para a CPI. Não há normas que estabeleçam um prazo-limite para que blocos e partidos indiquem seus representantes.
Outra ferramenta que o governo pode usar é pressionar os senadores a expandirem o escopo das investigações, incluindo a gestão de estados e municípios, diluindo assim o foco no governo. Na sexta-feira, Bolsonaro já fez um questionamento nesse sentido. Um dos senadores que apresentou o pedido ao STF para a instalação da CPI, Alessandro Vieira (Cidadania-SE), já manifestou ser favorável a essa ampliação, afirmando que a iniciativa acabaria “com as desculpas” de Bolsonaro contra a instalação da comissão.
Caso seja realmente instalada, a CPI deve convocar os antigos responsáveis pela política de Saúde do governo Bolsonaro: os ex-ministros Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello – o último já é alvo de um inquérito no STF por causa da gestão relapsa do governo na crise em Manaus. Teich e especialmente Mandetta hoje são críticos do governo.
Já Pazuello – que atuou como um cumpridor de ordens de Bolsonaro em seus dez meses de gestão – demonstrou nervosismo quando pressionado por senadores em uma audiência em fevereiro. A CPI também pode jogar mais luz sobre a falta de empenho do governo em negociar a compra de vacinas ao longo de 2020 e a insistência do Planalto em promover curas ineficazes.
Paralelamente, a CPI pode erodir a relação frágil de Bolsonaro com o Congresso. Hoje, governo e parlamentares protagonizam embates sobre o Orçamento. Bolsonaro tenta vetar trechos do texto aprovado no Legislativo, que supera em mais de R$ 30 bilhões o limite do teto de gastos. Caso seja aprovado dessa forma, o Orçamento pode configurar crime de responsabilidade e motivar a abertura de um processo de impeachment do presidente.
Mesmo com a CPI pairando, Bolsonaro também continua a demonstrar que não pretende adotar uma mudança profunda de rumo na gestão da pandemia. No sábado, Bolsonaro foi a uma igreja sem usar máscara e voltou a criticar medidas de distanciamento social.
Mas nas últimas semanas há sinais de que a paciência do Congresso em relação ao tema está se esgotando. No final de março, o presidente da Câmara, Arthur Lira, ameaçou se afastar do governo caso o Executivo não mudasse sua abordagem de combate à pandemia. “Estou apertando hoje um sinal amarelo para quem quiser enxergar”, disse Lira. “Tudo tem limite".