A gente quer viver inteira e não pela metade

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*Por Gilda Almeida

 

A luta pela emancipação da mulher na sociedade capitalista tem muitas dimensões. É a luta pelo fim da discriminação no mercado de trabalho, na política, e nas relações sociais de toda ordem. A jornada das mulheres para terem reconhecidos seus direitos se confunde com a jornada da própria sociedade pelo aprofundamento da democracia e da justiça.

 

No Brasil, algumas conquistas importantes merecem ser destacadas e, não é à toa, só foi possível em função do novo ciclo político e econômico iniciado no país pelo governo Lula. A criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres como espaço ministerial de articulação das políticas públicas com recorte de gênero tem sido um instrumento poderoso de combate à discriminação. A partir dela, a criação de vários programas como o Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra a Mulher, o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, o Mais Mulheres no Poder.

 

O programa Bolsa-Família, por exemplo, não tem especificamente um recorte de gênero, mas seu impacto na melhora da vida das mulheres é significativo. De acordo com pesquisa desenvolvida pela Universidade de Brasília (UNB) das 13, 8 milhões de famílias que recebem o Bolsa-Família, 92,37% dos titulares são as mulheres. O estudo aponta três impactos na condição social das mulheres titulares do benefício: aumento do poder de compra, com estímulo à economia local, já que o dinheiro utilizado circula no município; afirmação da autoridade e de mais autonomia feminina no espaço doméstico, uma vez que ela deixa de depender exclusivamente do marido-companheiro; e a percepção da própria mulher de ser uma cidadã brasileira (1).

 

Trabalhadora e sindicalista

 

No mercado de trabalho, temos ampliado e qualificado nossa participação, apesar das desigualdades que ainda marcam a situação das mulheres perante homens que desempenham a mesma função. Os dados sócio-demográficos mostram que para superar as diferenças – ou pelo menos reduzi-las, as mulheres ficam mais anos nos bancos escolares do que os homens trabalham jornadas mais extensas – mesmo precisando estudar e acumular as tarefas domésticas. Ou seja, para ocuparmos nossos espaços no mercado de trabalho temos que suar muito mais a camisa.

 

Essa maior presença da mulher no mundo do trabalho e os desafios enfrentados pelas trabalhadoras ainda precisam ser mais bem discutidos e apropriados pelo movimento sindical. Algumas categorias conseguem incluir nas negociações coletivas, por exemplo, cláusulas para impedir qualquer tipo de descriminação salarial, inclusive de gênero. Mas, outros temas como o da saúde da mulher, os direitos relativos à maternidade – e que vão muito além da licença-maternidade, do direito à amamentação e do auxílio-creche – ainda são um tabu em muitas categorias profissionais.

 

A própria participação da mulher no movimento sindical é uma questão que precisa ser enfrentada. Em muitas categorias somos a maioria das trabalhadoras, mas na diretoria das entidades sindicais ainda temos maior presença de homens.

 

Os obstáculos para a participação política da mulher podem ser vistos em todos os cantos. Na dificuldade para eleger parlamentares e mandatárias femininas e na sub-representação feminina no Poder Judiciário. Por exemplo, neste momento em que a Câmara dos Deputados elege a presidência das suas 21 Comissões, apenas uma será liderada por uma mulher: a Comissão de Cultura com a indicação da deputada Alice Portugal (PCdoB/BA).

 

Basta de Violência

 

Além da luta para conquistar nossos espaços, temos que lutar para combater a violência contra as mulheres. Somos vítimas de violência física, sexual, moral, psicológica dentro de nossas casas, no ambiente de trabalho, na escola. Conquistamos a Lei Maria da Penha, mas como diria o poeta Carlos Drummond de Andrade “as leis não bastam, os lírios não nascem das leis”. Temos que fazer valer a lei na vida, porque as estatísticas da violência ainda são alarmantes. Entre 1980 e 2010 foram assassinadas mais de 92 mil mulheres no Brasil. Só em 2011 mais de 4,5 mil mulheres foram assassinadas no país (2).

 

Neste Dia Internacional da Mulher, temos muito a comemorar e muito mais pelo que lutar. Porque nós somos mulheres que colecionamos muitos sonhos, dia após dia, vamos desenhando uma trajetória para transformar nossos desejos em realidade. Parodiando a música do Titãs: a gente não quer só comida, a gente quer comida, poder, amor e trabalho. A gente quer viver inteiro e não pela metade.

 

1 – Presença da Mulher, Edição 64 - Mulheres e o Programa Bolsa Família: uma breve leitura feminista, Nágyla Drumond

2 – Dados e Estatísticas sobre violência contra a mulher, www.compromissoeatitude.org.br

 

*Gilda Almeida é vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU), diretora de relações internacionais da Federação Nacional dos Farmacêuticos e Secretária de Finanças Adjunta da CTB.